Atualizado em 28 de abril, 2013 - 22:18 (Brasília) 01:18 GM
O desabamento de um prédio de
três andares onde funcionava uma fábrica de tecidos em Bangladesh
revelou não só o amplo descumprimento com normas básicas de segurança no
país, mas também o lado obscuro da indústria de roupas internacional.
Na tragédia, que ocorreu na capital Dhaka na semana passada, morreram pelo menos 377 pessoas.
Neste domingo, um incêndio iniciado
no meio dos escombros impediu o resgate de mais uma sobrevivente e
retardou o trabalho de buscas.
Por causa do fogo, quatro bombeiros foram hospitalizados.
Estimativas iniciais dão conta de que 3 mil pessoas trabalhavam no momento em que o prédio desabou. Cerca de 2.430 sobreviveram.
Confira, abaixo, o relato do correspondente da BBC no Sudeste da Ásia, Andrew North, que visitou o local da tragédia.
"É no norte da capital Dhaka que se concentra a maior parte das fábricas de roupas do país.
Muitas delas fabricam peças para marcas internacionalmente conhecidas.
Das casas de um quarto e dos casebres onde os
operários vivem, podem-se ver blocos de concreto de múltiplos andares
atravessando os céus da região.
Nos telhados, vigas de aço reforçado estão
aparentes, na esperança de que outro piso repleto de máquinas de costura
seja erguido.
Trata-se de um sinal, para os críticos, de que o
"boom de roupas" ultrapassou os limites, na tentativa desesperadora de
alimentar o apetite do Ocidente por vestimentas mais baratas.
O Rana Plaza, que desabou na semana passada, era
mais uma entre as dezenas de fábricas locais, com a cadeia de lojas
britânica Primark como um de seus principais clientes.
Em sua defesa, a Primark informou que estava
"chocada e entristecida" pelo desastre e que exigiria de seus outros
fabricantes uma revisão dos padrões de segurança no trabalho.
Mas esta é apenas uma pequena amostra de um cenário conhecido há bastante tempo na região.
Há menos de seis meses, no mesmo local, um
incêndio reduziu a cinzas uma fábrica que fazia roupas para a cadeia
americana de supermercados Walmart, matando 100 trabalhadores, até então
o maior acidente industrial já ocorrido em Bangladesh.
Desde essa tragédia, no entanto, esforços vinham sendo feitos timidamente.
Humayun Kabir, CEO da DIRD Ltd, que fabrica
cerca de 20 milhões de peças de roupa por ano para varejistas
britânicos, como Tesco, Sainsbury's e Next, afirmou que seus clientes já
estão "muito mais vigilantes", realizando, inclusive, inspeções não
programadas em suas plantas.
A placa com a frase "Proibido trabalho infantil"
adorna a entrada de muitas fábricas, assegurando o cumprimento de uma
lei nacional que impede o trabalho de menores de 18 anos na indústria de
roupas.
Mas ainda não está claro se os fiscais das
grifes internacionais também vêm procurando "falhas estruturais" nos
edifícios onde muitas dessas fábricas estão localizadas.
Segredo?
Em paralelo às grandes corporações, dezenas de
fábricas ilegais floresceram na capital de Bangladesh na última década
tentando tirar proveito do "boom" de roupas baratas.
Inúmeras dessas operações ocorrem à margem do
poder governamental e não cumprem com os requisitos mínimos de
segurança, como proteção contra incêndio.
Além disso, menores de idade trabalham nas linhas de confecção de roupas.
Uma dessas fábricas "ilegais", diz ele, fazia roupas destinadas ao Reino Unido nos últimos meses.
Não é segredo que muitas das grandes fábricas da
região sub-contratem plantas menores, como essas, para puxar os custos
para baixo e atender aos prazos dos clientes.
Nesses locais, a atividade pode ser apenas
pregar botões ou costurar zíperes. Em seguida, as roupas retornam à
fábrica contratante e "legal", sem que os compradores conheçam qualquer
detalhe desse processo.
Quando foi noticiado que a fábrica de Tazreen
fazia roupas para o Walmart, a varejista americana disse que não tinha
conhecimento dessas práticas.
A mesma estratégia de defesa é usada por outras fábricas localizadas no norte de Dhaka.
O governo de Bangladesh, por outro lado, alega
que quer melhorar as condições de trabalho, mas diz que se preocupa com
as consequências para as milhões de pessoas que dependem da indústria
para garantir sua sobrevivência.
"O maior direito humano é o direito à
sobrevivência", havia dito o ministro do Comércio do país, Ghulam
Mohammed Quader, em entrevista antes da tragédia da semana passada.
Entretanto, espera-se que a catástrofe convide a uma maior reflexão sobre o assunto.
Como um integrante de um sindicato de Bangladesh
disse à BBC: "Quando você compra algo e leva outro de graça – não é
exatamente de graça"".
Fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/04/130428_bangladesh_tragedia_lado_obscuro.shtml
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